A paixão é cega e cega os que se deixam dominar por ela. Temos, até certo ponto, medo dos apaixonados. Nem sempre as ditas pessoas apaixonadas dão provas de um certo equilíbrio. Há mesmo muitos crimes passionais. Com muita facilidade se pode passar do amor paixão ao ódio visceral. O amor-paixão pode ser perigoso. Pode destruir e não construir.
E, no entanto, não pode haver amor morno para Cristo e para o Evangelho. Há uma palavra dura do Apocalipse que sempre nos questiona. A testemunha fiel, o Amém, assim se dirige ao anjo da Igreja de Laodicéia: “Conheço as tuas obras. Oxalá, fosses frio ou quente. Mas porque és morno, nem frio nem quente, estou para vomitar-te de minha boca” (Ap 3,14-15). Nos últimos tempos temos ouvido e lido muito a respeito da expressão “ardor”, “novo ardor”. Quem fala em ardor pensa naquilo que queima, que é quente. Não podemos elogiar um cristão frio, indiferente, rotineiro, “fazedor de rezas e de tarefas”.
Ora, Francisco de Assis foi uma pessoa fervorosa. Podemos dizer que apaixonou-se por Cristo, isto é, teve os mesmos sentimentos de Cristo. Encantou-se com seu nascimento singelo, com sua mãezinha pobre, com o fato de não ter ele tido uma pedra para reclinar a cabeça. Francisco viveu interiormente a solidão e o abandono de Cristo em sua via sacra até o alto do trono pobre e duro da cruz. Compreendeu que Deus amava tornando-se simples, despojado, pobre. Encantava-se com o Senhor pobre e despojado nas frágeis aparências do pão.
Há, no coração de Francisco, o desejo de amar aquele que não é amado. Famosa a formulação franciscana: O amor não é amado. Se o amor não é amado será preciso tornar-se arauto e divulgador desse amor. Isso se chama zelo missionário ou apostólico. Os franciscanos seculares têm consciência aguda dessa necessidade.
“Devotava a Cristo um amor tão fervente, e seu bem amado lhe correspondia com uma ternura tão familiar que o servo de Deus pensava ter diante dos olhos a presença quase contínua do Salvador. Ele mesmo contou isso confidencialmente, várias vezes, a seus companheiros” (São Boaventura IX,2).
Omer Englebert tentando compreender o que se passou no coração de Francisco no momento de sua conversão, assim escreve: “O que se pode dizer é que, nesse momento, Francisco é um homem que encontrou o amor e que se sente iluminado do alto. E como tal agirá doravante, consentindo em passar por visionário aos olhos dos cegos que andam nas trevas, e cumprindo atos tidos por loucos por parte dos que nunca amaram. Pode-se acrescentar que nele sobreviverão, no que tem de melhor, seus entusiasmos e ambições juvenis. Como um artista que não muda de estilo ao mudar a inspiração, ele não perderá a originalidade nem tampouco sua nobreza. Ele tinha sonhado ser cavaleiro e cavaleiros permanecerá até à morte” (Vida de São Francisco de Assis, EST Edições, Porto Alegre, 2004, p.51).
Pensar em Francisco é pensar em alguém abrasado de amor. Ele foi designado de santo seráfico, por ser semelhante aos serafins, que vivem perto do fogo que é Deus.
Temos que prestar atenção para que nosso amor não seja paixão cega. De outro lado, o que seria um amor por Cristo sem um apaixonado e apaixonante testemunho? Há os que amam Cristo fria e cerebralmente. Há outros que o amam zelosa e apaixonadamente.
(Por: Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM - Assistente Nacional para a OFS e Assistente Regional da OFS do Sudeste II.)
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